A menos de três semanas do primeiro turno, a eleição já terminou para um em cada dez candidatos. Das 22.570 candidaturas registradas na Justiça Eleitoral nos estados e no Distrito Federal, 2.726 foram completamente descartadas por terem sido consideradas inaptas – seja por critérios de inelegibilidade (como os estabelecidos pela Lei da Ficha Limpa), seja por falta de documentação, seja por desistência ou morte dos candidatos. Outros motivos para a corrida ter parado para esses são candidatos, por exemplo, são a falta de filiação partidária e a não quitação de pendências eleitorais.
A maioria dos candidatos excluídos da disputa teve seu registro recusado por não obedecer às exigências da legislação eleitoral. Isso ocorreu com 1.749 candidatos. Outros 841 desistiram da corrida eleitoral antes da reta final. Cento e vinte candidaturas foram canceladas a pedido dos próprios partidos políticos. A lista dos inaptos inclui 12 candidatos em que a Justiça eleitoral sequer reconheceu a candidatura, dois que morreram durante a campanha e um que teve seu registro cassado.
O levantamento é feito diariamente pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Ele é alimentado pelos tribunais regionais eleitorais (TREs) e pelo próprio tribunal superior. Os dados usados pela reportagem foram atualizados às 17h de ontem (15). Apesar de fazer a distinção entre os candidatos aptos e inaptos, o TSE não possui levantamento do que levou ao indeferimento de cada um. Estimativa da assessoria de imprensa do tribunal aponta que aproximadamente 20% dos casos são relacionados à ficha limpa. A maioria trata-se de falta de documentação e falta de quitação eleitoral.
Entre os casos de candidatos que desistiram da disputa, estão o deputado federal Alceni Guerra (DEM-PR) e o ex-deputado distrital Junior Brunelli (sem partido, ex-PSC). O primeiro desistiu de concorrer à reeleição após sofrer impugnação do registro de candidatura com base na Lei da Ficha Limpa. Ele possui condenação por improbidade administrativa relativa ao tempo em que foi prefeito de Pato Branco (PR). Ao site, Guerra disse que se inscreveu somente para atender a um pedido do partido, mas que está concentrado em um projeto de combate ao crack e à coordenação da campanha de Beto Richa (PSDB) ao governo do Paraná.
Oração da propina
Já o caso de Junior Brunelli é um pouco diferente. Flagrado em vídeo recebendo dinheiro de propina das mãos de Durval Barbosa, delator do esquema conhecido como mensalão do Arruda, em referência ao ex-governador do DF José Roberto Arruda, ele renunciou ao mandato para escapar de um processo por quebra de decoro parlamentar na Câmara Legislativa local. Ele também estava em outra gravação, onde aparece fazendo o que ficou conhecido como “oração da propina”. O partido negou legenda para ele se candidatar à Câmara dos Deputados. Ao se inscrever à revelia, Brunelli foi impugnado pelo Ministério Público e expulso do PSC. Acabou renunciando à candidatura.
Quem também desistiu de recorrer para continuar na disputa foi a neta do ex-presidente Juscelino Kubitschek, Anna Christina Kubitschek Barbara Pereira. Mulher do ex-vice-governador do DF Paulo Octávio (sem partido, ex-DEM), ela estava inscrita para ser suplente na chapa de Alberto Fraga (DEM) ao Senado. Porém, teve o registro de candidatura negado pelo Tribunal Regional Eleitoral (TRE-DF) porque não apresentou no momento do registro de candidatura a prestação de contas da campanha de 2006, quando concorreu ao Senado. Ela desistiu do recurso ao TSE porque abriu mão de disputar a eleição.
Para o cientista político da Universidade de Brasília (UnB) Leonardo Barreto, o número não pode ser considerado “muito grande”. Isso por conta do sistema político brasileiro. Como os partidos têm a necessidade de preencher muitas vagas para candidatos, é normal, na visão de Barreto, que uma quantidade de registros seja barrada. “O sistema brasileiro tem uma facilidade de acesso para que as pessoas sejam candidatas”, afirmou. Ele comparou com outros países, onde a adoção de sistemas como de lista fechada ou voto distrital, por exemplo, levam os partidos a serem mais exigentes na escolha dos candidatos. “O sistema brasileiro é mais acessível, mais democrático”, opinou. Para o cientista político, a quantidade de pessoas fora da disputa ainda revela um outro lado. Barreto acredita que os partidos, atualmente, exercem um maior controle sobre seus nomes para as eleições.
Recursos
Outros 1.873 postulantes a cargos eletivos nestas eleições vão depender mais do que do julgamento do eleitor na hora do voto: o futuro deles será decidido pela Justiça eleitoral. São os candidatos que conseguiram registrar a candidatura, mas viraram alvo de recurso; e os que foram barrados, mas se mantêm na disputa até uma posição final dos magistrados. Estão nessa condição, por exemplo, os ex-governadores Paulo Maluf (PP-SP), Joaquim Roriz (PSC-DF) e Jader Barbalho (PMDB-PA). Outros 12 casos ainda estão em situação indefinida. Os dados fazem parte de levantamento atualizado do TSE.
Roriz, por exemplo, já está com recurso para ser julgado no Supremo. A expectativa do relator, ministro Carlos Ayres Britto é que o processo seja julgado na próxima semana. Em julho de 2007, Roriz renunciou ao mandato de senador para o qual foi eleito em outubro de 2006 por conta de uma representação do Psol por quebra de decoro. A representação do Psol referia-se aos fatos investigados pela Operação Aquarela, que obteve gravações de ligações telefônicas em que Roriz aparecia discutindo a partilha de um cheque de R$ 2 milhões do empresário Nenê Constatino, dono da empresa Gol Linhas Aéreas. Na defesa, o então senador afirmou que a conversa era para fechar a compra de uma bezerra.
Por conta da renúncia, Roriz teve o registro de candidatura indeferido com base nas novas regras de inelegibilidade. Pela nova redação da Lei das Inelegibilidades (Lei Complementar 64/90) – atualizada pela ficha limpa -, quem renuncia ao cargo para escapar de um processo por quebra de decoro está inelegível por oito anos contados a partir do encerramento do mandato. No caso do ex-governador, ele só poderia concorrer a uma eleição a partir de 2023, já que foi eleito em 2006, tomou posse em 2007 e ficaria no Senado até janeiro de 2015.
Deputados
Proporcionalmente, o maior índice de candidatos barrados é registrado entre aqueles que pretendiam ocupar uma cadeira na Câmara dos Deputados. Dos 6.038 candidatos a federal, 766 (12,68%) já estão fora da disputa. Além deles, outros 501 lutam pelo voto do eleitor e pelo direito, na Justiça, de tomar posse caso sejam eleitos. Estão nessa situação os 402 que seguem na disputa graças a recurso e os 99 cujas candidaturas foram consideradas regulares pelos magistrados mas que enfrentam algum tipo de contestação. Até o momento, apenas 232 desistiram da eleição à Câmara.
Um deles é o tesoureiro da campanha da petista Dilma Rousseff á presidência da República, José de Filippi Junior (PT). Em 23 de agosto, ele teve a candidatura de deputado federal barrada pelo Tribunal Regional Eleitoral de São Paulo (TRE-SP). A inscrição foi indeferida porque Filippi não entregou certidões criminais necessárias. Em 1º de setembro, o TRE paulista reverteu a decisão após a equipe do petista apresentar o documento que faltava. No entanto, seu status no sistema do TSE aparece “deferido com recurso”. Ou seja, continua precisando defender sua candidatura na Justiça.
Na disputa ao Senado, cerca de dez por cento dos candidatos também já foram eliminados. Dos 273 postulantes à vaga de senador, 15 foram barrados por não se adequarem à legislação, dez desistiram e dois tiveram seu registro cancelado a pedido das legendas.
Para Leonardo Barreto, a quantidade de recursos é reflexo da lentidão da Justiça brasileira. “Por conta disso, nós não sabemos quem são os candidatos”, afirmou. O cientista político acredita que a atuação do TSE, até o momento, tem sido “catastrófica”, fazendo o Brasil “se igualar às piores republiquetas”. “Por mais bem intencionado que seja o TSE, existe uma demora muito grande para julgar os casos. E a Lei da Ficha Limpa trouxe uma instabilidade ao cenário político”, disse. Barreto não questiona o mérito da lei, mas diz que, ao ser aplicada neste momento, ela trouxe ainda mais trabalho para a Justiça Eleitoral.
Congresso em Foco
Mario Coelho e Edson Sardinha