segunda-feira, 13/05/2024
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Oito perguntas para José Henrique Pilotto, pesquisador da Fiocruz, sobre coronavírus: “Momento de mudança de comportamento”

José Henrique Pilotto é médico, pesquisador da Fundação Oswaldo Cruz, doutor em pesquisa clínica em doenças infecciosas e vice-diretor do laboratório de Aids e Imunologia Molecular do Instituto Oswaldo Cruz/Fiocruz. Nome muito considerado no Rio, com grande parte da vida dedicada ao assunto mais falado nos últimos dias: vírus, tanto quanto o mais temido deles, o Coronavírus. “Precisamos começar a cuidar “do outro”; este é um momento de solidariedade e mudança de comportamento!”, diz o pesquisador de doenças virais. 1

Qual o maior medo de um infectologista/virologista no caso de um Coronavírus?

Os infectologistas e virologistas estão preparados para lidar com a epidemia do novo Coronavírus – COVID-19 e possíveis complicações. Os Coronavírus são uma grande família de vírus que podem causar doenças em animais ou humanos. Em humanos, sabe-se que vários Coronavírus causam infecções respiratórias que variam do resfriado comum a doenças mais graves, como a Síndrome Respiratória do Oriente Médio (MERS) e a Síndrome Respiratória Aguda Grave (SARS). O Coronavírus descoberto mais recentemente causa a doença de Coronavírus COVID-19. Esse novo vírus e doença eram desconhecidos antes do início do surto em Wuhan, China, em dezembro de 2019.2

É possível que muita gente pode ser transmissor do vírus e não ser diagnosticado ou nem  sequer ir a um hospital porque os sintomas são parecidos com a gripe?

Sim, existe essa possibilidade. Neste momento, estima-se que 80% das pessoas infectadas terão uma forma branda da doença, um estado gripal, sem complicações. Entretanto, o “não diagnóstico” pode facilitar a transmissão do vírus para familiares, amigos e a população, e esses contactantes podem eventualmente adoecer com formas graves da doença, principalmente indivíduos idosos portadores de outras comorbidades (diabetes, asma crônica, portadores de neoplasias em quimioterapia, transplantados, portadores de doença cardíaca crônica, etc). Importante também lembrar que os dados atuais sugerem que a pessoa com infecção pelo Covid-19 pode transmitir a doença ainda durante o período de incubação, desde até 4 dias antes do início dos sintomas, o que pode aumentar a chance de transmissão interpessoal do vírus. 3

As máscaras acabaram, o álcool gel acabou nas farmácias e assim vai. Até que ponto usar esses produtos seria necessário? E como fazer para acalmar os ânimos dos brasileiros? 

As máscaras de proteção e o álcool gel não conseguirão frear a epidemia sozinhos; estes são complementares às medidas de prevenção da infecção e transmissão do COVID-19. O álcool gel não substituirá a higienização das mãos com água e sabão, assim como as máscaras sozinhas não impedirão a infecção. As máscaras têm as suas indicações para uso e devem ser usadas sensatamente, e sem pânico. Pessoas sem sintomas respiratórios, como tosse, não precisam usá-la. A OMS recomenda para pessoas com sintomas e para aqueles que cuidam de indivíduos com sintomas, como tosse e febre..4

O que o senhor gostaria de falar que não está sendo divulgado e julga importante, não no sentido de alarmar ou diminuir a importância da doença ou dos cuidados, mas o fato real? 

Um artigo científico, publicado recentemente (31 de janeiro de 2020) no Journal of Hospital Infection, com revisão da literatura sobre informações da persistência do Coronavírus em superfícies, revelou que o mesmo pode persistir em superfícies de metal, vidro ou plástico por até 9 dias, mas que pode ser inativado eficientemente em um minuto pela desinfecção das superfícies com álcool 70%, ou hipoclorito de sódio 0.1% (cloro). Essa informação é particularmente útil e importante para comerciantes que recebem um grande fluxo de clientes diariamente.5

Na contramão do Coronavírus, que surgiu lá na China, não vimos no Brasil notícias sobre a dengue, Zica ou Chikungunya neste verão, mas são doenças endêmicas. Acredita que o Coronavírus “mascarou” essas informações?

Acredito que, de fato, o surgimento de um novo vírus, com capacidade de disseminação mundial, tende a concentrar um pouco a atenção da população e da mídia. Por outro lado, tivemos em 2019 uma elevação de mais de 400% nos casos notificados de dengue no país, em relação a 2018, com aumento significativo também nos casos de Chikungunya e Zika nesse período. E os dados notificados até a quinta semana de 2020 mostram um aumento em relação ao mesmo período de 2019. Esse aumento no número de casos notificados mostra, além de uma real recrudescência da doença, que a população e o sistema de saúde como um todo continuam vigilantes, atentos a esse problema. Por se tratar de uma endemia, a prevenção de tais doenças deve ser contínua, ainda mais nesta época do ano, e independentemente do surgimento de outras doenças/infecções. É necessário não perder o foco naquelas doenças que já estão aqui e vão continuar.6

No Brasil, mais ainda no Rio, somos acostumados a abraçar, beijar, tocar. O senhor acredita que esse comportamento pode mudar temporariamente?

Somos muito afetivos no Brasil, cumprimentamos os amigos e conhecidos com aperto de mãos, beijos e abraços. Entretanto, no enfrentamento de uma nova epidemia, precisamos começar a cuidar “do outro”; este é um momento de solidariedade e mudança de comportamento! Medidas de higiene das mãos e cuidados pessoais são fundamentais na prevenção da infecção pelo COVID-19. Esse comportamento precisa mudar frente à necessidade de contenção da transmissão de infecções virais, e isso vale para influenza, Coronavírus, sarampo, etc. Será difícil reduzir o impacto dessa epidemia sem a ajuda da população. Em época de disseminação global de um vírus ainda pouco conhecido, cuja transmissão não foi totalmente elucidada, essa mudança de comportamento, ainda que temporária, me parece fundamental.7

Aliás, segundo um estudo da Diretoria de Análise de Políticas Públicas da FGV (Fundação Getúlio Vargas), nesta sexta (28/02), cerca de 34% das interações nas redes com menções ao vírus são irônicas ou bem-humoradas, com diversos memes e piadas. Como o senhor vê esse comportamento?

O brasileiro é sempre bem-humorado, entretanto precisamos ter cautela! O risco dessas interações nas redes é a banalização de uma epidemia que pode perder o controle se não tiver a ajuda da população para conter a transmissão do vírus. Outra preocupação importante também relacionada às menções ao vírus nas redes é o risco de disseminação de informações falsas, como já vem ocorrendo de forma intensa no último mês. Vídeos e textos amplamente divulgados, inclusive de suposta autoria de médicos, com informações erradas, desatualizadas ou meras suposições, aumentam o desconhecimento sobre a doença e podem prejudicar a aplicação das medidas corretas de prevenção. É necessária a higienização das mãos com sabonete e água por, pelo menos, 40 a 60 segundos, ou uso de álcool gel 70% por 20 a 30 segundos. Lembrar de retirar anéis, pulseiras e relógio antes de lavar as mãos, e secar com papel toalha. É importante lavar as mãos após ir ao banheiro, espirrar, tossir, ou assoar o nariz. É importante manter uma distância de pelo menos 1 metro de pessoas que estejam tossindo ou espirrando. Manter as unhas mais curtas ou aparadas. Evitar tocar a boca, olhos e nariz, sem higienização das mãos e não compartilhar alimentos, copos, e objetos de uso pessoal.8

 Pelo beijo na boca ou pelo sexo, é 100% certo o contágio?

A transmissão pelo beijo na boca de um caso confirmado de infecção pelo Coronavírus é muito provável! Em relação ao sexo, recentemente, alguns artigos científicos descreveram a detecção de vírus no sêmen de homens infectados por viroses, os quais previamente se desconhecia que seriam transmitidos sexualmente. Dois desses exemplos são o Zika vírus e o Ebola, que foram encontrados no sêmen de pacientes infectados sintomáticos. Entretanto, embora a detecção dessas viroses no sêmen não seja uma surpresa, a contribuição desse fenômeno para a transmissão viral e, consequentemente, para a epidemiologia da doença e saúde pública, ainda precisa ser definido.

IG-Por Lu Lacerda

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Parmenas Alt
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